junho 09, 2014

Beijo-peão não se (re)corda

- Não se recorda do beijo?
- Que beijo?
- Ontem.. o beijo, minha boca, a tua, o calafrio nos pés, arrepio na nuca.
- ...
- Não se recorda?
- ?
- O beijo!
- Que beijo? Como me podes pedir pra relembrar o beijo embriagado de (ante)ontem? O que é o que você se lembra, senão a figura decrépita de um momento? Diferente de lembrar-se de um discurso, d'uma aula, dos números de uma conta de banco, beijo não se memoriza, não se guarda, não se esconde atrás de nostalgia. Beijo se recorda beijando. Tal como um peão que, uma vez solta a corda, não se pode mais (re)cordar. Já é outro peão, outro beijo. Não me recordo do beijo não porque me esqueci, meu amor, mas porque não há o que se lembrar. A corda já foi lançada, não dá pra recordar. Não hã memória, recordação nem lembrança que me faça sentir tua boca na minha. Não quero lembrar dos teus beijos: te quero é beijar. 
- E o que resta?
- Nada. Só outro beijo. E outro. E mais uns. Minha boca. A tua. O calafrio nos pés. arrepio na nuca.

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